segunda-feira, 29 de agosto de 2011

NOVA ZELÂNDIA (primeira parte)

Como é bela uma asa em pleno vôo...
Uma vela em alto-mar...
Sua vida - toda ela! - esta contida
Entre o partir e o chegar... (Mario Quintana)
   
A viagem a Nova Zelândia (NZ) é uma aventura em si.  A viagem até a Ilha Sul da NZ pode ser feita de duas maneiras: por Buenos Aires ou Santiago até Auckland, na ilha norte, passando (próximo ao Círculo Polar Ártico) pelo sul do planeta e durando aproximadamente 18 horas. E depois em outro vôo de Auckland para Christchurch. Ou indo por Dubai, Bangkok, Sidney e Christchurch, com aproximadamente 37 horas de vôo. Foi este o trajeto que fiz.
Tem-se o dia mais curto da vida ao viajar de leste a oeste. Depois a noite mais longa ao voltar, de oeste para leste. Dá a impressão de que não chega nunca. 
A escala de algumas horas em Dubai, após 15 horas de voo, é providencial. O aeroporto parece um grande shopping center, com múltiplas esteiras rolantes, bares, restaurantes, lojas. Tem chuveiro com água quente! São banheiros limpos, com tudo funcionando e com boxes para banho. Eles fornecem sabonete líquido, mas você tem que levar sua toalha. Porém, com um pouco de conversa amigável você consegue um bom punhado de toalha de papel para se enxugar. Quando ofereci gorjeta para o zelador, ele recusou com um sorriso indignado. Em Dubai o turista é sempre bem tratado.
A escala em Bangkok e depois em Sidney é de apenas uma hora. Se você optar por descer do avião (aconselhável), deve levar seus pertences de mão. Mais uma razão para viajar leve, com pouca coisa. Uma mochila ou valise pequena para livros, mapas, casaco e material de higiene pessoal. Não mais que isso.
Optei por ficar três dias em Bangkok na ida. Aproveitei para uma pausa salutar, após 23 horas viajando (15 horas até Dubai depois mais 8 horas até Bangkok). E para conhecer um pouco da Tailândia. 
É necessário haver tomado vacina contra febre amarela, mas na imigração ninguém vai avisá-lo e também não há placas, de que o cartão de vacina internacional tem que ser validado por um funcionário específico. Só fui avisado disso depois de esperar duas horas em pé na fila da imigração. Tive que sair, procurar nos confins do aeroporto o tal escritório da vigilância sanitária para o funcionário carimbar e assinar um papel, sem nem ao menos olhar o cartão de vacinas, e retornar à fila para mais uma ou duas horas de espera. 
Quando desembarcar em Bangkok, vá direto ao local de controle de vacinas, levando seu cartão internacional, antes de entrar na fila da imigração.
Sempre tive curiosidade em conhecer os templos budistas da cidade.  O Templo do Buda Reclinado, do Buda de Ouro e o Gran Palace, antiga moradia real; e o museu de seda Jim Thompson. Jim Thompson foi um agente da CIA que teria abandonado a profissão e, aposentado, decidido fazer uma seda melhor que a chinesa. Possível, pelo conhecimento e pelos segredos que teria adquirido naquela profissão. Fez, e desapareceu após uma saída rotineira num dia qualquer. Até hoje não se sabe de seu paradeiro.
O museu é anexo a uma loja de produtos lá fabricados e a um restaurante. E mostra os diversos passos da transformação do produto da lagarta em um tecido de extrema leveza e beleza. 
Ao lado há uma butique dos produtos fabricados lá. As roupas são verdadeiras obras de arte. Fica difícil escolher algo para trazer de presente. O restaurante é bem informal, com mesas distribuídas numa varanda ampla e arejada, circundada por um jardim florido e um lago artificial, com abundantes carpas coloridas nadando em todo seu contorno. A comida é ótima. Os frutos do mar servidos com raro equilíbrio de temperos, com manga, mamão e capim santo. Exótico e agradável. Os sucos naturais de lichia e abacaxi eram frescos, consistentes, saborosos.
 

Para conhecer Bangkok, contrate um guia oficial, vale cada centavo. Contratei um guia que nos levou de carro, com motorista. O carro era um SUV coreano confortável, com ar condicionado, água gelada e lencinhos de pano úmidos, como nos restaurantes orientais. O motorista nos deixava na porta dos templos, com o guia e depois vinha nos apanhar. O guia, budista, era muito bem treinado, bom profissional, com excelente conhecimento de história e filosofia. Discorria em inglês fluente com facilidade, respondendo sem embaraço às perguntas e indicando os melhores lugares para observar e fotografar. 
A escolha do guia com transporte é adequada, porque o trânsito é caótico. Imagine o centro de São Paulo às 18 horas, acrescente centenas de "tuk tuk" (as motos com carroceria para passageiros) e uma poluição assustadora. É assim.
         
Vá a bons restaurantes tailandeses. Não são caros. Escolha, no cardápio, os pratos com apenas uma pimenta (nos restaurantes habituados a receber turistas, o cardápio vem com uma, duas ou três pimentas na frente de cada prato, indicando o teor de “ardência” do dito).  A comida, quase sempre frutos do mar com pimenta e capim santo, é inesquecível.
Interessante que embora os pratos sejam apimentados, a sensação de ardor não perdura tanto quanto a das nossas pimentas. A sensação picante passa em minutos.
Se for aventureiro, não deixe de experimentar o ovo “pidan”. É considerado uma iguaria. O ovo de pata, cru, fica enterrado durante cem dias, com palha de arroz e cinza. A clara fica esverdeada, translúcida e a gema escura. 
Um conselho: coma de uma vez. Tem sabor peculiar, indescritível; é como se alguém pedisse para descrever o sabor de trufa branca. Difícil dizer. E assim como as trufas frescas, não deve ser cheirado. O cheiro desencoraja.
  
A cidade é movimentada, poluída e o trânsito caótico, com os "tuk tuks" por todos os lados, mas as pessoas são gentis e atenciosas. Sempre o cumprimentam com o “Khop Kun Krap” para homem e “Khop Kun Kha” para mulher, uma saudação budista, e um sorriso. Alguns cronistas referem-se a Bangkok como a cidade dos sorrisos.

A escala em Sidney foi apenas para esticar as pernas e tomar um café. Após apenas quatro horas chega-se ao destino final, Christchurch.
O que primeiro chama a atenção na Nova Zelândia é o vento. Achei que o avião não conseguiria pousar.  Presenciei muitos pousos, mas aquele foi o primeiro que vi o avião balançar tanto. Era um Airbus A 380, com 540 passageiros, gigantesco, balançando como um brinquedo antes das rodas tocarem o chão.  Pensei na dificuldade em sair daquele avião enorme e alto, se acontecesse alguma coisa. Olhei ao redor e era estranho como não havia rostos de pânico. Parece que era o habitual por ali. Isso acalmou-me um pouco. Enfim, pousou tranquilamente. 
 A imigração é rápida e bem organizada, mas as regras para entrada são rígidas. Você tem que declarar se leva botas de "trekking" ou tenda de acampar na bagagem, sob pena de multa de 400 dólares se eles apreenderem. Eles exigem que você mostre as botas para ver se não há vestígios de terra com sementes e fungos que possam contaminar a ilha. São rígidos e eficientes, mas são corteses.
Christchurch é a segunda maior cidade da NZ e a maior cidade da Ilha Sul. Fica na costa leste e tem por volta de 300 mil habitantes. Tem uma catedral com uma ampla praça no centro, tem riozinhos que cortam a cidade, ladeados por gramados e árvores em todo o trajeto, com bancos à sombra. O trânsito é tranqüilo, calmo, silencioso. Parece uma cidadezinha do interior da Europa, porém mais espaçosa. (Pouco depois que estive lá, um terremoto destruiu todo o centro da cidade, inclusive a catedral).
O centro de informações turísticas fica na praça central. É muito bem estruturado e organizado. Podem-se comprar bilhetes para os bondes que fazem passeios turísticos pelos arredores e para a “gôndola”, um teleférico que leva a um monte de onde se avista toda a cidade, um lago e o oceano Pacífico. Apesar de ser pleno verão não dispense o casaco. E um copo de vinho no bar lá em cima. 
O cuidado com o meio ambiente é animador. Enquanto subia, no teleférico que chamam de gôndola, cruzamos com outro carro que descia com pratos e louça suja para serem lavados na base da montanha. Lá no topo é proibida qualquer atividade poluente.
  A segunda coisa que chama a atenção na NZ é a cordialidade do povo. O neozelandês não é nada estressado. O passante é capaz de parar para perguntar de onde você é e ficar conversando sobre amenidades, sobre o tempo, a geografia. É comum outros transeuntes pararem e entrarem na conversa. 
A sensação é de calma absoluta, de tranquilidade. Não se veem mendigos, meninos de rua nem policiais. A cidade é limpa, ordeira e calma.
Fiquei num hotel da rede Ibis no centro, próximo à catedral. Não pague pelo café no hotel, vá tomar seu "breakfast" no Drexel's Restaurant logo em frente. Uma experiência gastronômica imperdível (e absurdamente calórica).
O "shuttle" do hotel à estação ferroviária é grátis mas deve-se fazer a reserva com antecedência no próprio hotel. O transporte da bicicleta custa 5 dólares. 
Aluguei um carro que seria dirigido pela Dely, minha companheira. Junto com a bici, aluguei um “rack” para transportá-la.
Minha intenção era pedalar 60 a 70 km por dia. Combinávamos um local e ela ia me esperar. Depois da pedalada, que terminava ainda de dia, por volta de 15 ou 16 horas, teríamos tempo para passear pelas redondezas de carro.