As ilhas que compõe as Hébridas são pequenas, pouco populosas e os ferrys geralmente partem apenas uma vez ao dia. Quando se perde o ferry, só no dia seguinte, se houver lugar. E um aviso aos afoitos: o mar do Atlântico Norte é muito gelado para nadar. Decidi fazer a rota sul-norte, por causa do vento que habitualmente sopra nesse sentido. Já sofri muito no Canadá e na Nova Zelândia com os ventos contra. A travessia de Oban a Castlebay é feita em 5 horas. No Castlebay Hotel fomos atendidos pela Jessica. Uma moça bem jovem, ruiva, cheinha, pele bem branca, vestida com uniforme preto, sorridente e prestativa. Ela cuidava do hotel, do bar e do restaurante. Sempre correndo. Mas chegamos tarde para o jantar. Comemos pão, queijos e frios no quarto.
No dia seguinte saímos cedo, morrendo de vontade de pedalar.
Fomos, minha irmã, meu cunhado e eu de bici e minha companheira foi dirigindo, saindo
mais tarde. Do hotel até o porto de Ardmhor (Aird Mhòr) , onde
tomaríamos o ferry para a Ilha de Eriskay (Eirisgeigh), são aproximadamente 15
km. Confesso que fomos bem devagarzinho, comendo a paisagem com os olhos.
Pedalamos ao lado do mar o tempo todo. À direita, colinas rochosas escaladas
sempre por ovelhas que paravam curiosas quando passávamos.
Os campos, entre o mar e as colinas, são floridos mas de
cores muito diferentes das que vemos habitualmente. São flores bem douradas,
outras roxas, outras vermelhas, amarelas, azuis. É muito impressionante. O sol da manhã refletindo no mar azul, com a areia das
praias bem brancas, aquele campo florido, reluzente, multicolorido e a estradinha
estreita era emocionante. Havia uma brisa fresca no rosto. Minha irmã se
emocionou às lágrimas com tanta beleza. Em determinado momento olhou para mim
sem dizer nada e balançou a cabeça, embargada de emoção, enquanto pedalava. Ficamos em silêncio, em respeito total àquele espetáculo
único da natureza, pedalando devagar.
O embarque das bici no ferry é tranqüilo. Apeia-se e se as
empurra até um local já definido. Logo depois minha companheira chegou,
sorridente, feliz com as fotos que havia tirado no percurso. A viagem de Ardmhor `a ilha de Eriskay é curta, 40 minutos. Pegamos nossas bicis e seguimos.
A estrada inicial, de uns 2 km é uma caseway,
aquelas estradas elevadas feitas sobre águas rasas que liga as ilhas. Era uma
estrada estreita e como ventava um pouco, podíamos sentir os respingos do mar. Ao término desta caseway, entra-se na ilha de South Uist
(Uibhist A Deas). Segue-se no mesmo padrão de estrada até Bebencula (Beinn Na Faoghla)
aproximadamente 50km. A estrada é bem pavimentada, muito estreita, sem
acostamento, para apenas um carro. Há, a intervalos regulares, pequenas áreas
pavimentadas em forma de meia lua, para se parar e aguardar o carro que vem em
sentido contrário passar. Se a área estiver à esquerda é você que deve parar e
dar passagem. Se estiver à direita, pode ir que o outro vai parar. Em nenhum momento vi alguém desrespeitar essa
regra. Mesmo de bici, os carros param e esperam, pacientemente, você passar.
Esse trecho é diferente do anterior. É bem plano, há poucas colinas,
poucos campos floridos, não se veem construções, nem animais. Não chega a ser
monótono porque a proximidade do mar e a estradinha sinuosa dão prazer em
pedalar. De Bebencula a Berneray(Beàrnaraigh) são 45 km de caseways,
estradinhas bem estreitas passando por fazendas. O terreno é irregular, com
aclives e descidas longos embora não muito inclinados. De Berneray a Leverburg(An
t-Ob) é uma hora de ferry. Em Leverburg há um mercadinho logo no desembarque, bom para
se abastecer de água, pão e frutas. A
pedalada volta a ficar belíssima, com o mar à esquerda, colinas rochosas à
direita e campos floridos. As praias são imensas. Não resisti, passei pela
cerca e comecei a pedalar na praia, indo longe, mais de um quilômetro em
direção ao mar e ainda na areia.
Estávamos chegando em Tarbert (An Tairbeart), a 34km, onde
ficaríamos no B&B Beul na Mara da Catherine,
uma simpática senhora entre seus 75 e 80 anos. Ela cuidava sozinha da casa.
Tinha três quartos para alugar. Os quartos eram arejados, com roupa de cama e
banho de boa qualidade, cheirosos e a limpeza era impecável. O café da manhã
era servido em uma varanda envidraçada com vista para uma daquelas praias
imensas. Não dava vontade de sair dali. A Catherine era orgulhosa de seu
Porridge, um mingau de aveia salgado. Também servia a pedidos, bacon , salsicha
e ovos fritos na hora, tomate e cogumelos assados. Era um bom café da manhã.